Pobreza relativa e desigualdade são
constitutivas insuperáveis da ordem do capital – o que pode variar são seus
níveis e padrões. Mas as políticas hoje implementadas para o enfrentamento da
pobreza estão longe de afetar positivamente esses níveis e padrões.
O combate às desigualdades não faz
parte do conjunto prático e ideológico do neoliberalismo, é seu elemento
constitutivo um elenco de programas sociais voltados ao enfrentamento da
pobreza. Esse elenco neoliberal é caracterizado pelos seguintes traços:
·
Desresponsabilização do Estado e do setor público com
uma política social de redução da pobreza articulada coerentemente com outras
políticas sociais; o combate à pobreza opera-se como uma política específica;
·
A desresponsabilização do Estado e do setor público em
fundos reduzidos, responsabilizando a “sociedade civil” e a “família” pela ação
assistencial; enorme revelo é concedido a organizações não governamentais e ao chamado terceiro setor.
·
Desdobra-se o sistema de proteção social: para os
seguimentos populacionais que dispõem de alguma renda, há a
privatização/mercantilização dos serviços a quem pode recorrer; para os
seguimentos mais pauperizados há serviços públicos de baixa qualidade.
A política voltada para a pobreza é prioritariamente emergencial,
focalizada e, no geral, reduzida a dimensão assistencial. Os programas de
combate à pobreza são conduzidos a partir da tese segundo a qual, alcançados
resultados de “ajuste”, o primeiro dos quais é a estabilidade econômica, seguram
o crescimento econômico e uma “natural” redistribuição de renda. Considerando
que a orientação macroeconômica dos planos de ajuste deixa pouquíssima margem
para investimentos em infraestrutura de saneamento, em equipamentos coletivos
de saúde e em gastos sociais, o que se tem na América Latina neoliberal são as
ações minimalistas para enfrentar uma questão social maximizada.
No momento histórico que se vivencia no marco das condições do
capitalismo contemporâneo – crescimento reduzido, agravamento da pobreza e
acentuação da desigualdade, é importante indagar sobre os desafios
profissionais do serviço social.
A resposta de Netto e simultaneamente uma negação e uma afirmação. Tais
desafios não se situam no âmbito de técnicas ou procedimentos interventivos –
vale dizer, não se inserem no circuito instrumental. Netto está convencido que
o exercício profissional, em face de uma questão social exponenciada pela
pobreza e pela desigualdade, situa-se noutro âmbito.
Os desafios profissionais do Serviço social inscrevem-se no âmbito da
compreensão do significado social de sua intervenção, e este significado só é
inteligível elucidarem as condições em que as relações sociais se processam na
sociedade contemporânea.
A compreensão do significado social da ação profissional não soluciona o
campo problemático das técnicas e dos instrumentos de intervenção. Ela tão
somente estabelece o espaço em que tal solução pode ser procurada, ela permite
superar alguns dos mais enraizados equívocos que tem marcado o exercício
profissional.
É apenas a partir da clareza da determinação do estatuto do Serviço
Social na divisão sócio-técnica do trabalho e da condição do assistente social
como profissional assalariado que se pode demonstrar com rigor a falácia e o
equivoco de subsumir o exercício profissional a exigências de natureza
político-partidária.
Somente a compreensão da dinâmica socioeconômico contemporânea, pode
abrir à via a resolução de problemáticas inerentes e próprias à ação
profissional. Dependendo, porém, de como o problema pobreza seja compreendido,
na sua gênese e no seu movimento, o seu trato profissional haverá de variar e
hão de variar os procedimentos para interferir nos grupos humanos por eles
afetados. Só o profissional que possuir e souber manejar categorias capazes de qualificar
teórica e socialmente a pobreza, poderá se colocar, corretamente o problema dos
instrumentos e das estratégias de intervenção; para um profissional que
compreende a pobreza como natural e insuprimível e para outro que a apreende
como um resultante necessário da exploração.
É da dupla compreensão - a do significado social da profissão e da
dinâmica do capital contemporâneo- que permite ao profissional reconhecer os
limites e as possibilidades da intervenção do Serviço Social. O limite parece
claro: nenhuma ação profissional suprimirá a pobreza e a desigualdade na ordem
do capital. Mas seus níveis e padrões podem variar e essa variação é
absolutamente significativa – e sobre ela pode incidir a ação profissional,
incidência que porta as possibilidades da intervenção que justifica e legitima
o Serviço Social.
O assistente social só se afirmou profissionalmente, à medida que se
afirmaram entre eles, no plano jurídico político, alguns diretos sociais. Se é
correta a vinculação entre afirmação e ampliação de direitos sociais e
institucionalização do Serviço Social, decorre dela o desafio profissional
central com que nos defrontamos é a própria ordem social contemporânea: ao
exponenciar a questão social com revigorados dispositivos de produção e
reprodução de pobreza e desigualdade, ela os processa mediante a redução e o
recorte dos direitos sociais. Mas também decorre a viabilidade de um exercício
profissional que sem ignorar os seus limites, amplie suas possibilidades,
articulando a sua intervenção com o movimento de outras categorias
profissionais e sintonizando suas ações som as forças sociais que operam na
sociedade para reverter às políticas e as estratégias que conduzem a
barbarização da vida social.
Por Priscila Morais.
REFERÊNCIA:
NETTO, José Paulo. A ordem social
contemporânea é o desafio central.
33º Conferência Mundial de Escolas de Serviço Social.
33º Conferência Mundial de Escolas de Serviço Social.
Santiago do Chile, 28/31 de agosto de 2006.
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