segunda-feira, 16 de maio de 2016

A contramão da evolução da Política Pública de Assistência Social

Há cerca de 20 anos vivemos um processo de amadurecimento da Política de Assistência Social deixando para trás um passado de práticas assistencialistas, paternalistas, positivistas e populistas com base na caridade cristã.
O Primeiro Damismo (vício de se nomear a primeira dama como secretária de assistência social) começa a ganhar destaque em meados dos anos 30 a 45, coincidindo com dois grandes fatos político-sociais: a Segunda Guerra Mundial (Europa) e o período do Estado Novo (Brasil). No período surgiram também as chamadas “damas da caridade”, moças e senhoras ricas que sem ter com o que ocupar seu tempo livre, pois na época não existia facebook, twitter nem orkut, se dedicavam a ajudar aos mais necessitados. Era como se o prefeito precisasse ter a sua esposa como uma espécie de “mãe dos pobres” para amenizar as mazelas sociais que emergiam no período.
Nesse tempo ainda não existia a Política Pública de Assistência Social. Tal política vem ganhando forma há cerca de 20 anos apenas, e esse rompimento entre o “velho e o novo” tem sido um debate constante entre os profissionais e estudantes de serviço social (assistentes sociais).
Atualmente a assistência social é política pública e deve ser tratada com o profissionalismo do qual necessita, ou seja, com os profissionais capacitados para trabalharem as demandas da Política de Assistência Social.
Digo sempre aos meus amigos, trabalhadores da assistência, (para quem não sabe sou assistente social e tenho alguns anos de profissão) que infelizmente a maioria dos prefeitos tratam a prefeitura como se fosse a sua casa e a SEMTEPS (Secretaria Municipal de Trabalho e Promoção Social) como se fosse a cozinha de sua casa. A falta de profissionalismo é grande, e a prefeitura, assim como suas secretarias, se assemelham a casa da mãe Joana, como diz o ditado.
Ao passo em que a Política de Assistência Social ganha corpo com suas leis, resoluções, tipificações, dentre outros a nível local ou municipal ainda existe um grande amadorismo no trato com a Política de Assistência. Já vi secretárias (esposas) chamar pedofilia de pedoflia e CAD-Único de Cards-Uni! O que caracteriza uma total falta de conhecimento sobre o assunto.
A maioria das pessoas acreditam que o cargo de secretária de assistência é uma espécie de herança ou tradição inquestionável atribuído às esposas dos prefeitos, mas, a evolução das Políticas Públicas de Assistência exigem que seja uma pessoa capacitada para tal cargo e de preferência, com formação em serviço social ou em políticas públicas. A esposa do prefeito pode sim ser secretária de assistência ou de qualquer outra secretaria, mas, desde que tenha conhecimento para tal e de preferência, que faça parte do quadro de funcionários efetivos para evitar que seja caracterizado como nepotismo. Logo, secretária de assistência-primeira dama sem competência para assumir tal cargo, além de ser irresponsabilidade do gestor público municipal, é nepotismo.
Devido a grande exigência do MDS (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome), em muitos municípios, a primeira dama-secretária de assistência acaba por ocupar uma função honorária sendo necessário a contratação de assessores para a realização do trabalho de gestão das Políticas Públicas de Assistência, não quero dizer que o secretário de assistência não deva ter assessores, eles são muito importantes devido a complexidade da Política de Assistência, o que estou dizendo é que o trabalho da então secretária-primeira dama fica a cargo somente de seus assessores cabendo à ela apenas a “palavra final”, a assinatura de documentos, a aparição em eventos públicos, cabe a ela a benevolência cristã, a distribuição de cestas básicas, simplesmente exercendo seu papel de “mãe dos pobres”. É um avanço e um retrocesso concomitantes na Política de Assistência Social.
Hoje temos assistentes sociais que estudaram anos em uma universidade para que possam conduzir a Política de Assistência Social. As "damas das caridades" ficaram no passado. Primeira dama na chefia da gestão de uma política pública tão importante sem o menor conhecimento sobre a assistência social é inconcebível!
Em outubro de 2012, o Conselho Nacional de Assistência Social publicou uma carta aberta na qual rejeita o Primeiro damismo e outras práticas, conforme trecho abaixo:
Os assistentes sociais repudiam essa prática do primeiro damismo!

Esse texto é uma Carta Aberta do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), no período das Eleições Municipais 2012
  

O texto acima nos remete a uma situação atual, na qual Marcela Temer (primeira dama) foi anunciada por Temer, em entrevista, para assumir a área da assistência social, o que nos faz recordar o primeiro damismo...
A política de Assistência Social é um política de direito, da seguridade social, e deve ser conduzida por profissionais qualificados, e não por "esposas". A Assistência social não é "fazer o bem sem olhar a quem", não é caridade e nem bondade. Só falta agora o retorno da LBA para o circo ficar completo.

Priscila Morais


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