Pessoal, estou fazendo leituras sobre a questão social, artigos, livros e textos, dentro da tradição teórica marxiana.
Indico para vocês a leitura do texto do Netto "5 notas a propósito da questão social", "o debate contemporâneo sobre a questão social" de Yolanda Guerra e também o livro que está, inclusive aqui, entre minha lista de livros nos marcadores ao lado e que também já indiquei como leitura num dos postes do blog "Uma nova 'questão social'"? de Edilene Pimentel.
O texto abaixo é da ultima autora citada, na verdade, não se trata exatamente de um texto, mas de uma exposição sobre os fundamentos da questão social. Não pedi, logo, não tenho autorização da autora (que, por sinal, já foi minha professora) para postar o texto na integra, por isso, posto apenas a introdução que servirá de referencial para o aprofundamento dos estudos e da pesquisa acerca dessa temática, a meu ver, bastante instigante e necessária ao Serviço Social. Tive acesso a esse texto e a outros dessa autora, através de uma disciplina "questão social e serviço social" que cursei no PPGSSO - UFAL.
Boa leitura e boas reflexões! Espero que esse trecho do texto instigue, aos interessados, a pesquisar a respeito dessa temática, assim como interessou a mim, devido a estreita articulação com o meu objeto de estudo que é a pobreza.
Priscila Morais
Conferência:
AS BASES ONTOLÓGICAS DA QUESTÃO SOCIAL
Edlene
Pimentel*
Nesta exposição irei tratar aqui de
uma temática de grande relevância para o Serviço Social As Bases Ontológicas da Questão Social. A questão Social é hoje
reconhecida até mesmo como objeto e como base da fundação e da ação do Serviço
Social como profissão. Aqui quero ressaltar particularmente o entendimento que
tenho da Questão Social, qual o lugar que ocupa no capitalismo e quais são as
bases essenciais de sua existência enquanto fenômeno e de sua visibilidade no
século XIX, que se manifesta em especial no surgimento do processo de
industrialização capitalista.
Tratar
das bases ontológicas da questão social nos remete a desvendar sua gênese
histórica, as determinações econômicas e as dimensões essenciais que a
configuram. Para tanto tomo por referência os ensinamentos de Karl Marx sobre a
criação das desigualdades sociais no modo de produção capitalista e as
consequências para o proletariado que ali se gesta, suas condições de vida e de
trabalho. Condições que acabam por incitar reações e formas de resistência as
mais variadas em um período marcado pelo surgimento de uma consciência de
classe cujo caráter político torna-se incômodo ao aparente equilíbrio e à
harmonia social desejados pela burguesia que assumira o poder.
Importa ressaltar que, Karl Marx em
nenhum momento na sua produção teórica se referiu ao termo “Questão Social”. Os
problemas decorrentes da exploração capitalista eram por ele denominados de
“males sociais”. O termo “Questão Social”, segundo Castel, surge pela primeira
vez no jornal legitimista francês La
Quotidienne, em 1831, onde se acusava o governo, chamando a atenção dos
parlamentares, no sentido de que era preciso entender que além dos limites do
poder, isto é, fora do campo político, existia uma “questão social” carente de
resposta, já que ela representava uma ameaça à ordem estabelecida. Portanto, o
termo em si é de origem liberal referido ao fenômeno do pauperismo dos
trabalhadores decorrente do processo de industrialização na Inglaterra no final
do século XVIII e as mazelas dele decorrentes, trazendo no seu interior um
caráter explosivo, para usar uma expressão de Mészáros. De maneira que, a
Questão Social expressa algo existente na realidade, requisitando reflexões por
parte de pensadores diversos na expectativa de explicar tal fenômeno e
identificar propostas de solução.
Na
realidade, com o advento do capitalismo, ocorre uma transformação radical nos
processos e nas relações sociais de produção já desvendados por Marx em O
Capital. Em tal processo a expulsão dos trabalhadores do campo e sua absorção
pela indústria capitalista nascente trouxeram problemas nunca vistos nos modos
de produção anteriores na medida em que resultou na concentração da mão de obra
nas cidades não inteiramente absorvida, identificada por Marx na Lei Geral da
Acumulação Capitalista como exército industrial de reserva. A pauperização do
trabalhador, resultante da industrialização, impõe o ingresso de sua família no
mercado de trabalho para ampliação da renda, visando assegurar a reprodução
social do trabalhador e de sua família. Esse processo atinge o operário no que
se refere às suas condições de vida e de trabalho em termos materiais e
políticos.
A pobreza resultante do processo de
industrialização surge com características bastante diferenciadas do momento
anterior ao capitalismo. O fenômeno inquieta pela ameaça que representa a ordem
social criada após a Revolução Francesa e a ascensão da
burguesia ao poder e pela inexplicável persistência da pobreza, que agora se
apresentada com uma nova qualidade em relação ao pauperismo até então conhecido
em decorrência do baixo desenvolvimento das forças produtivas. Diz respeito a uma pauperização
da classe operária, ditada pelas necessidades do capital, que se põe
historicamente permeada pelas lutas dos trabalhadores e pelas estratégias de
dominação das classes dominantes para contê-las. Portanto, o pauperismo se
altera e se apresenta naquele momento sob novas formas. Esse fenômeno
que se originou com o pauperismo e as formas de luta política daí decorrentes
constitui uma das expressões primeiras daquilo que se convencionou denominar de
“questão social”.
De
modo que no meu entendimento a questão social é constituída por três dimensões
essenciais que se articulam entre si. São elas:
1. Suas raízes materiais e seu fundamento
teórico, contidos na Lei Geral da Acumulação Capitalista;
2. Sua dimensão política, que diz respeito
à organização e a luta dos trabalhadores;
3. A intervenção do Estado, que depende da
fase do desenvolvimento capitalista que este experimenta.
* Docente do Programa de
Pós-graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Alagoas – UFAL –
Brasil. Doutora em Serviço Social.
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