Pessoal, estou há dias procurando um material que sintetize de forma coerente e sem deixar perder a riqueza da leitura do capitulo XXIV do livro O Capital. MARX, Karl (A assim chamada acumulação primitiva). De todos os materiais que li, esse foi o que mais me pareceu adequar-se aos requisitos ditos anteriormente. No entanto, obviamente, não devemos dispensar a leitura desse material em sua fonte.
Segue abaixo o resumo do referente capitulo. Boa leitura.
Priscila Morais
Por Boanerges Freitas
OBJETIVO:
investigar as causas que permitiram a acumulação primitiva de capitais, “...
uma acumulação que não é resultado do modo de produção capitalista, mas sim seu
ponto de partida.” (Marx, p.339).
IMPORTANTE:
A análise da acumulação primitiva feita por Marx, tem como intuito principal
desvendar os fatores que proporcionaram o aparecimento de um novo modo de
produção, o capitalista. Isso não quer dizer que a gênese do modo de produção
capitalista tenha se dado em outras partes do globo da mesma forma como se
processou na Grã Bretanha.
ESTRUTURA:
Seção
1: O segredo da acumulação primitiva
Seção
2: expropriação do povo do campo de sua base fundiária
Seção
3: Legislação sanguinária contra os expropriados desde o final do século XV.
Leis para o rebaixamento dos salários
Seção
4: Gênese dos arrendatários capitalistas
Seção
5: Repercussão da revolução agrícola sobre a indústria. Criação do mercado
interno para o capital industrial
Seção
6: Gênese do capitalista industrial
Seção
7: Tendência histórica da acumulação capitalista
Seção
1: O segredo da acumulação primitiva
Escreve
Marx:
Viu-se
como o dinheiro é transformado em capital:
D –
M – D’
-
condições necessárias para que o dinheiro se transforme em capital:
1 –
existência de uma classe possuidora de dinheiro, meios de produção e meios de
subsistência e que desejam valorizar a soma-valor que possuem mediante a compra
de força de trabalho alheia;
2 –
existência de trabalhadores livres (não pertencem aos meios de produção como
escravos ou servos e nem os meios de produção lhes pertencem) vendedores da
própria força de trabalho.
Viu-se
como é produzida a mais-valia:
-
com a ampliação da jornada do trabalho além do necessário para produzir
mercadorias suficientes para remunerar o trabalhador tem-se a materialização da
mais-valia.
-
jornada de trabalho: 8 horas por dia
-
as primeiras 4 horas são utilizadas para produzir mercadorias equivalentes ao
salário do trabalhador
-
as 4 horas restantes são apropriados pelo capitalista (mais-valia).
Viu-se
como da mais-valia é produzido mais capital:
D’
– M – D’’
PORÉM:
A
acumulação do capital pressupõe a mais-valia;
A
mais-valia pressupõe a produção capitalista;
A
produção capitalista pressupõe a existência de massas relativamente grandes de
capitais e de força de trabalho, ou seja, observando-se o processo deste ângulo
(do estado atual para o seu início) tem que se supor uma acumulação primitiva.
Como
ocorreu a acumulação primitiva?
Dizer
que a acumulação primitiva foi fruto da laboriosidade, parcimônia e
inteligência do que, hoje, corresponde a elite burguesa é o mesmo que dizer que
as demais pessoas (atuais trabalhadores) foram vagabundos vilipendiadores de
seus bens.
Na
história real, como se sabe, a conquista, a subjugação, o assassínio para
roubar, em suma, a violência, desempenham o principal papel. (Marx, p. 340) à estes foram os reais
mecanismos utilizados para concentrar capitais nas mãos de poucos e relegar a
grande maioria a própria sorte.
O
autor é enfático:
A
assim chamada acumulação primitiva é, portanto, nada mais que o processo
histórico de separação entre produtor (trabalhador) e meio de produção. Ele
aparece como primitivo porque constitui a pré-história do capital e do modo de
produção que lhe corresponde (capitalista). (Marx, p.340)
Esta
separação é um processo histórico: o trabalhador afastado da propriedade das
condições de seu trabalho (meios de produção) é impelido a vender a única
mercadoria que lhes resta para sobreviver: a força de trabalho.
A
estrutura econômica da sociedade capitalista nasceu da estrutura econômica da
sociedade feudal. A decomposição desta liberou elementos para a formação
daquela. (MARX, p.340).
A
partir do momento em que o servo pôde dispor de sua “liberdade” só lhes restou
a possibilidade de vender sua força de trabalho para sobreviver. Quando,
finalmente, se desvencilhou das obrigações feudais, restou-lhes a venda da
força de trabalho (o produtor direto se transforma em trabalhador assalariado).
Sem
as velhas garantias feudais, apartados dos seus meios de produção (todas as terras
passam a ter dono, inclusive as comunais), tornam-se vendedores de si mesmos.
Diante
desse novo cenário, aparecem dois atores principais: de um lado, o capitalista,
que é dono dos meios de produção e proprietário de dinheiro, ele aumenta suas
riquezas com a compra do trabalho alheio; de outro lado situa-se o trabalhador,
expropriado de seus meios de subsistência, restando-lhe apenas uma alternativa
que é vender sua força de trabalho.
De
acordo com Marx: O ponto de partida do desenvolvimento que produziu tanto o
trabalhador quanto o capitalista foi a servidão do trabalhador. A continuação
[o progresso deste processo] consistiu numa mudança de forma dessa sujeição, na
transformação da exploração feudal em [exploração] capitalista. (MARX, p.341).
Dentre
todos os acontecimentos históricos relevantes que servem de alavanca a classe
capitalista em formação sobressaem os momentos em que grandes massas da
população são arrancadas de seus meios de produção e lançadas no mercado de
trabalho como proletários.
Seção
2: expropriação do povo do campo de sua base fundiária
No
processo de expropriação, os camponeses ficam privados de seu meio de produção
(a terra), ocorre assim, à dissociação entre o trabalhador e a propriedade. Os
camponeses são obrigados a vender sua força de trabalho para garantir sua
sobrevivência.
Marx
data com extrema precisão o início do processo de avanço do capitalismo na
Inglaterra: O prelúdio do revolucionamento que criou a base do modo de produção
capitalista, ocorreu no último terço do século XV e nas primeiras décadas do
século XVI. Uma massa de proletários livres como pássaros foi lançada no
mercado de trabalho pela dissolução dos séqüitos (conjunto de pessoas que
acompanham outras por obrigação ou cortesia) feudais (MARX, p.343).
A
expulsão violenta de uma grande massa de servos de sua base fundiária motivada
pela elevação dos preços da lã (as terras passariam a ser utilizadas para
criação de ovelhas) resultou numa grande massa proletária.
Durante
certo período as atrocidades cometidas pelos proprietários de terras contra os
servos foram objeto de leis que tentavam amenizar o impacto brutal das
expulsões:
“Naquele
tempo” (1489) “aumentaram as queixas sobre a trans-formação de terras de
lavoura em pastagens” (para criação de ovelhas etc.) “fáceis de cuidar por
poucos pastores; e arrenda-mentos por tempo determinado, vitalícios ou
anualmente revogáveis (dos quais vivia grande parte dos yeomen [camponeses])
foram transformados em domínios senhoriais. Isso provocou uma decadência das
cidades, igrejas, dízimos. (...) Na cura desse mal, a sabedoria do rei e do
Parlamento naquela época foi admirável. (...) Tomaram medidas contra essa
usurpação despovoadora das terras comunais (depopulating inclosures) e a
exploração pastoril despovoadora (depopulating pasture) que lhe seguia as
pegadas”. (Marx, p. 344)
Mas
o que o sistema capitalista requeria era, ao contrário, uma posição servil da
massa do povo, sua transformação em trabalhadores de aluguel e a de seus meios
de trabalho em capital. Durante esse período de transição, a legislação
procurou também conservar os 4 acres de terras junto ao cottage [cabana] do
assalariado agrícola e lhe proibiu de tomar inquilinos em seu cottage. (Marx,
p. 345)
O
processo de expropriação violenta da massa do povo recebeu novo e terrível
impulso, no século XVI, pela Reforma e, em conseqüência dela, pelo roubo
colossal dos bens da Igreja. Na época da Reforma, a Igreja Católica era a
proprietária feudal de grande parte da base fundiária inglesa [terras que
abrigavam inúmeros servos]. A supressão dos conventos etc. lançou seus
moradores na proletarização. Os próprios bens da Igreja foram, em grande parte,
dados a rapaces favoritos reais ou vendidos por um preço irrisório a
arrendatários ou a habitantes das cidades especuladoras, que expulsaram em
massa os antigos súditos hereditários, juntando suas explorações. (Marx,
p.345-6)
Diga-se:
durante o período que Marx chama de transição certas leis tentavam proteger o
camponês, mas este processo de expropriação do trabalhador agrícola de suas
terras era inexorável e, por volta de 1750, já estava consolidado.
Outra
contribuição a expropriação:
A
Glorious Revolution (Revolução Gloriosa) trouxe, com Guilherme III de Orange,
extratores de mais-valia fundiários e capitalistas ao poder. Inauguraram a nova
era praticando o roubo dos domínios do Estado, até então realizado em
proporções apenas modestas, em escala colossal. Essas terras foram
presenteadas, vendidas a preços irrisórios ou, mediante usurpação direta, anexadas
a propriedades privadas. Tudo isso ocorreu sem nenhuma observância da etiqueta
legal. O patrimônio do Estado apropriado tão fraudulentamente, junto como roubo
da Igreja, na medida em que não sumiram durante a revolução republicana, formam
a base dos atuais domínios principescos da oligarquia inglesa. Os capitalistas
burgueses favoreceram a operação visando, entre outros motivos, transformar a
base fundiária em puro artigo de comércio, expandir a área da grande exploração
agrícola, multiplicar sua oferta de proletários livres como os pássaros,
provenientes do campo etc. Além disso, a nova aristocracia fundiária era aliada
natural da nova bancocracia, da alta finança que acabava de sair da casca do
ovo e dos grandes manufatureiros, que então se apoiavam sobre tarifas
protecionistas. (Marx, p.347-8)
O
roubo assume a forma parlamentar que lhe dão as leis relativas ao cercamento de
terras comuns, ou melhor, os decretos com que os senhores das terras se
presenteiam com os bens que pertencem ao povo, tornando-os sua propriedade
particular, decretos da expropriação do povo. (Marx, p.349)
Um
outro exemplo dado por Marx de expropriação é o dos celtas, clãs da região
montanhosa da Escócia. Os celtas estavam organizados em clãs, cada um era
proprietário do solo em que ocupava sendo o “grande homem” (chefe do clã) o
proprietário titular. A atitude do governo escocês foi transformar seu direito
de titular do solo em direito de propriedade privada, resolvendo enxotar os
membros do clã pelo uso da violência.
Marx
cita a frieza da duquesa de Sutherland, que por motivos econômicos transformou
os seus domínios em pastagens, ocasionando a expulsão de 3000 famílias: Ela
dividiu toda a terra roubada do clã em 29 grandes arrendamentos para a criação
de ovelhas... Em 1825, os 15.000 aborígines [nativos] gaélicos estavam
substituídos por 131.000 ovelhas... Em sua fidalguia, a duquesa foi a ponto de
cobrar 2 xelins e 6 pences de renda em média por acre , a ser paga por membros
do clã, que há séculos, tinham vertido seu sangue em defesa de seus nobres
antepassados. (MARX, p.353-4)
O
roubo dos bens da Igreja, a fraudulenta alienação dos domínios do Estado, o
furto da propriedade comunal, a transformação usurpadora e executada com
terrorismo inescrupuloso da propriedade feudal e clânica [dos clãs] em
propriedade privada moderna, foram outros tantos métodos idílicos da acumulação
primitiva. Eles conquistaram o campo para a agricultura capitalista,
incorporaram a base fundiária ao capital e criaram para a indústria urbana a
oferta necessária de um proletariado livre como os pássaros. (Marx, p.355)
Seção
3: Legislação sanguinária contra os expropriados desde o final do século XV.
Leis para o rebaixamento dos salários
Os
expulsos pela dissolução dos séquitos feudais e pela intermitente e violenta
expropriação da base fundiária, esse proletariado livre como os pássaros não
podia ser absorvido pela manufatura nascente com a mesma velocidade com que foi
posto no mundo. Por outro lado os que foram bruscamente arrancados de seu modo
costumeiro de vida não conseguiam enquadrar-se de maneira igualmente súbita na
disciplina da nova condição. Eles se converteram em massas de esmoleiros,
assaltantes, vagabundos, em parte por predisposição e na maioria dos casos por
força das circunstâncias. (Marx, p.356)
A
legislação para combater a vagabundagem era rigorosa: A legislação os tratava
como criminosos “voluntários” e supunha que dependia de sua boa vontade seguir
trabalhando nas antigas condições, que já não existiam. Na Inglaterra, essa legislação
começou sob Henrique VII. (Marx, p. 356)
Henrique
VIII, 1530: Esmoleiros velhos e incapacitados para o trabalho recebem uma
licença para mendigar. Em contraposição, açoitamento e encarceramento para
vagabundos válidos. Eles devem ser amarrados atrás de um carro e açoitados até
que o sangue corra de seu corpo, em seguida devem prestar juramento de
retornarem a sua terra natal ou ao lugar onde moraram nos últimos 3 anos e “se
porem ao trabalho” (Marx, p.356)
Eduardo
VI: Um estatuto de seu primeiro ano de governo, 1547, estabelece que, se alguém
se recusa a trabalhar, deverá ser condenado a se tornar escravo da pessoa que o
denunciou como vadio. O dono deve alimentar seu escravo com pão e água, bebida
fraca e refugos de carne, conforme ache conveniente. Tem o direito de forçá-lo
a qualquer trabalho, mesmo o mais repugnante, por meio do açoite e de
correntes. Se o escravo se ausentar por 14 dias será condenado à escravidão
pelo resto da vida e deverá ser marcado a ferro na testa ou na face com a letra
S; caso fuja pela terceira vez, será executado como traidor do Estado. O dono
pode vendê-lo, legá-lo, ou, como escravo, alugá-lo, como qualquer outro bem
móvel ou gado. Se os escravos tentarem alguma coisa contra os senhores, devem
ser da mesma forma executados. (Marx, p.356-7)
Elisabeth,
1572: Esmoleiros sem licença e com mais de 14 anos de idade devem ser duramente
açoitados e terão a orelha esquerda marcada a ferro, caso ninguém os queira
tomar a serviço por 2 anos;em caso de reincidência, se com mais de 18 anos,
devem ser executados,caso ninguém os queira tomar a serviço por 2 anos; numa
terceira incidência, serão executados sem perdão, como traidores do Estado.
(Marx, p.357)
Assim,
o povo do campo, tendo sua base fundiária expropriada à força e dela sendo
expulso e transformado em vagabundos, foi enquadrado por leis grotescas e
terroristas numa disciplina necessária ao sistema de trabalho assalariado, por
meio do acoite, do ferro em brasa e da tortura. Não basta que as condições de
trabalho apareçam num pólo como capital e no outro pólo, pessoas que nada têm
para vender a não ser sua força de trabalho. Não basta também forçarem-nas a se
venderem voluntariamente. Na evolução da produção capitalista, desenvolve-se
uma classe de trabalhadores que, por educação, tradição, costume, re-conhece as
exigências daquele modo de produção como leis naturais evidentes. A organização
do processo capitalista de produção plena-mente constituído quebra toda a
resistência, a constante produção de uma superpopulação mantém a lei da oferta
e da procura de trabalho e, portanto, o salário em trilhos adequados às
necessidades de valorização do capital, e a muda coação das condições
econômicas sela o domínio do capitalista sobre o trabalhador. Violência
extra-econômica direta é ainda, é verdade, empregada, mas apenas
excepcionalmente. Para o curso usual das coisas, o trabalhador pode ser
confiado às “leis naturais da produção”, isto é, à sua dependência do capital
que se origina das próprias condições de produção, e por elas é garantida e
perpetuada. (Marx, p.358-9)
Leis
para o rebaixamento dos salários
A
burguesia nascente precisa e emprega a força do Estado para “regular” o
salário, isto é, para comprimi-lo dentro dos limites convenientes à extração de
mais-valia, para prolongar a jornada de trabalho e manter o próprio trabalhador
num grau normal de dependência. Esse é um momento essencial da assim chamada
acumulação primitiva. (Marx, p.359)
Marx
relata as várias leis e regulamentos criados para manter os salários baixos e a
exploração elevada: leis proibindo os capitalistas a pagarem salários mais
elevados do que os estabelecidos, leis proibindo a associação dos
trabalhadores, proibindo as greves, etc.
Seção
4: Gênese dos arrendatários capitalistas
Depois
que consideramos a violenta criação do proletariado livre como os pássaros, a
disciplina sanguinária que os transforma em trabalhadores assalariados, a
sórdida ação do soberano e do Estado, que eleva, com o grau de exploração do
trabalho, policialmente a acumulação do capital, pergunta-se de onde se
originam os capitalistas. (Marx, p.363)
Nesta
passagem o autor desvenda a gênese do arrendatário capitalista na Inglaterra,
desde seu estágio primitivo que é o bailiff [bailio], ainda servo, sendo
substituído durante a segunda metade do século XV, pelo meeiro. O meeiro logo
se torna o arrendatário propriamente dito que: “procura expandir seu próprio
capital empregando trabalhadores assalariados e entrega ao landlord [dono da
terra] uma parte do produto excedente, em dinheiro ou em produtos, como renda
da terra”.
Seção
5: Repercussão da revolução agrícola sobre a indústria. Criação do mercado
interno para o capital industrial
Com
a liberação de parte do povo do campo, os alimentos que este consumia
anteriormente também são liberados. Eles se transformam agora em elemento
material do capital variável. O camponês despojado tem de adquirir o valor
deles de seu novo senhor, o capitalista industrial, sob a forma de salário.
Assim como os meios de subsistência, foram afetadas também as matérias-primas
agrícolas nacionais da indústria. Transformaram-se em elemento do capital
constante. (Marx, p.365)
Criação
do mercado interno para o capital industrial
A
expropriação e a expulsão de parte do povo do campo liberam,com os trabalhadores,
não apenas seus meios de subsistência e seu material de trabalho para o capital
industrial, mas criam também o mercado interno. (Marx, p.367)
Assim,
com a expropriação de camponeses antes economicamente autônomos e sua separação
de seus meios de produção, se dá no mesmo ritmo a destruição da indústria
subsidiária rural, o processo de separação entre manufatura e agricultura. E
somente a destruição do ofício doméstico rural pode proporcionar ao mercado
interno de um país a extensão e a sólida coesão de que o modo de produção
capitalista necessita. (Marx, p.367)
Seção
6: Gênese do capitalista industrial
Marx
relata a origem dos capitalistas industriais:
a) Sem dúvida, alguns pequenos mestres corporativos
e mais ainda pequenos artesãos independentes ou também trabalhadores
assalariados transformaram-se em pequenos capitalistas e, mediante exploração
paulatinamente mais ampliada do trabalho assalariado e a correspondente
acumulação, em capitalistas sanas phrase [sem disfarce]. (Marx, p.369)
b) A Idade Média, porém, legou duas formas
diferentes de capital, que amadurecem nas mais diversas formações
sócio-econômica se, antes mesmo da era do modo de produção capitalista, contam
como capital quand même [em geral] — o capital usurário e o capital comercial.
O capital monetário formado pela usura e pelo comércio foi impedido pela
constituição feudal no campo e pela constituição corporativa nas cidades de se
converter em capital industrial. Essas barreiras caíram com a dissolução dos
séquitos feudais, com a expropriação e a expulsão parcial do povo do campo. A
nova manufatura foi instalada nos portos marítimos de exportação ou em pontos
no campo, fora do controle do velho sistema urbano e de sua constituição
corporativa. (Marx, p.369)
c) A descoberta das
terras do ouro e da prata, na América, o extermínio, a escravização e o
enfurnamento da população nativa nas minas, o começo da conquista e pilhagem
das Índias Orientais, a transformação da África em um cercado para a caça
comercial às peles negras marcam a aurora da era de produção capitalista. Esses
processos idílicos são momentos fundamentais da acumulação primitiva. (Marx,
p.370)
d) O sistema colonial fez amadurecer como plantas
de estufa o comércio e a navegação. As “sociedades monopolia” (Lutero) foram
alavancas poderosas da concentração de capital. Às manufaturas em expansão, as
colônias asseguravam mercado de escoamento e uma acumulação potenciada por meio
do monopólio de mercado. O tesouro apresado fora da Europa diretamente por
pilhagem, escravização e assassinato refluía à metrópole e transformava-se em
capital. (Marx, p.372)
e) Sistema de crédito público: A dívida do Estado,
isto é, a alienação do Estado — se despótico, constitucional ou republicano —
imprime sua marca sobre a era capitalista. A única parte da assim chamada
riqueza nacional que realmente entra na posse coletiva dos povos modernos é —
sua dívida de Estado. A dívida pública torna-se uma das mais enérgicas
alavancas da acumulação primitiva. Tal como o toque de uma varinha mágica, ela
dota o dinheiro improdutivo de força criadora e o transforma, desse modo, em
capital, sem que tenha necessidade para tanto de se expor ao esforço e perigo
inseparáveis da aplicação industrial e mesmo usurária. Os credores do Estado,
na realidade, não dão nada, pois a soma emprestada é convertida em títulos da
dívida, facilmente transferíveis, que continuam a funcionar em suas mãos como
se fossem a mesma quantidade de dinheiro sonante [moeda corrente]. (Marx,
p.373)
f) O
sistema protecionista: O sistema protecionista foi um meio artificial de
fabricar fabricantes, de expropriar trabalhadores independentes, de capitalizar
os meios nacionais de produção e de subsistência, de encurtar violenta-mente a
transição do antigo modo de produção para o moderno. Os Estados europeus
disputaram furiosamente entre si a patente desse invento, e, uma vez colocados
a serviço dos extratores de mais-valia, não se limitavam para esse fim a gravar
seu próprio povo, indiretamente por meio de prêmios de exportação etc. Nos países
secundários dependentes, toda a indústria foi violentamente extirpada, como,
por exemplo, a manufatura de lã irlandesa, pela Inglaterra. (Marx, p.375)
Sistema
colonial, dívidas do Estado peso dos impostos, proteção, guerras comerciais
etc., esses rebentos do período manufatureiro propriamente dito se agigantam
durante a infância da grande indústria. (Marx, p.376)
Com
o desenvolvimento da produção capitalista durante o período manufatureiro, a
opinião pública da Europa perdeu o que lhe restava de sentimentos de vergonha e
consciência. As nações se jactavam cinicamente de cada infâmia que fosse um
meio para acumular capital:
-
trabalho de crianças (as crianças eram levadas e escravizadas pelos
capitalistas, trabalhavam acorrentadas as máquinas, trabalhavam a noite, tinham
uma jornada de 18 horas por dia, eram torturadas);
-
trabalho feminino.
Seção
7: Tendência histórica da acumulação capitalista
Chegando
ao sétimo tópico da chamada acumulação primitiva, o autor questiona a
propriedade privada capitalista, visualizando-a como o germe sustentador do
modo de produção capitalista. A propriedade privada outrora pertencente ao
próprio trabalhador, foi transformada em propriedade privada capitalista na
qual o proprietário (o capitalista) não trabalha, mas sim explora o trabalho
alheio.
...
a transformação dos meios de produção individualmente e parcelados em [meios]
socialmente concentrados, portanto da propriedade minúscula de muitos em
propriedade gigantesca de poucos, portanto a expropriação da grande massa da
população de sua base fundiária, de seus meios de subsistência e instrumentos
de trabalho, essa terrível e difícil expropriação da massa do povo constitui a
pré-história do capital. (Marx, p.380)
Essa
expropriação se faz por meio do jogo das leis imanentes da própria produção
capitalista, por meio da centralização dos capitais. Cada capitalista mata
muitos outros. Paralelamente a essa centralização ou à expropriação de muitos
outros capitalistas por poucos desenvolve-se a forma cooperativa do processo de
trabalho em escala sempre crescente, a aplicação técnica consciente da ciência,
a exploração planejada da terra, a transformação dos meios de trabalho em meios
de trabalho utilizáveis apenas coletivamente, a economia de todos os meios de
produção mediante uso como meios de produção de um trabalho social combinado, o
entrelaçamento de todos os povos na rede do mercado mundial e, com isso, o
caráter internacional do regime capitalista. Com a diminuição constante do
número dos magnatas do capital, os quais usurpam e monopolizam todas as
vantagens desse processo de transformação, aumenta a extensão da miséria, da
opressão, da servidão, da degeneração, da exploração, mas também a revolta da
classe trabalhadora, sempre numerosa, educada, unida e organizada pelo próprio
mecanismo do processo de produção capitalista. O monopólio do capital torna-se
um entrave para o modo de produção que floresceu com ele e sob ele. A
centralização dos meios de produção e a socialização do trabalho atingem um
ponto em que se tornam incompatíveis com seu invólucro capitalista. Ele é
arrebentado. Soa a hora final da propriedade privada capitalista. Os
expropriadores são expropriados. (Marx, p.380-1)
Marx
vê na classe trabalhadora o instrumento histórico - universal para alcançar o
objetivo da revolução social, que consiste na expropriação dos capitalistas por
meio da extinção da propriedade privada capitalista e, posteriormente, a
socialização dos meios de produção.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Karl
Marx foi um dos primeiros intelectuais a estudar com afinco o modo capitalista
de produção, de forma minuciosa, conseguindo em sua análise decifrar os pontos
fundamentais de seu funcionamento, compreendendo como ponto chave da transição
do modo de produção feudal para o modo de produção capitalista, “A Chamada
acumulação primitiva”.
O
autor desenvolve uma visão crítica da sociedade vendo-a como um sistema
antagônico no qual há uma luta de classes incessante: “A sociedade burguesa
moderna, que brotou das ruínas da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos
das classes. Estabeleceu novas classes, novas condições de opressão, novas
formas de luta no lugar das antigas.”(MARX e ENGELS, 2000, p. 9)
Enquanto
o séc. XIX, para alguns intelectuais é visto apenas pela aparência que o modo
de produção capitalista produziu suas parafernálias e maravilhas, Marx busca a
essência, vendo o sistema desde sua gênese, e é na acumulação primitiva de
capital que ele desvenda sua face obscura.
NOTAS
1.
“O conceito de acumulação primitiva formulado por Marx é relativamente claro,
mas discute-se se ele constitui o quadro adequado para a análise da transição
para o capitalismo. Mesmo que se considere correta a análise que Marx fez do
caso da Grã Bretanha, não se pode admitir que ela dê conta do estabelecimento
do capitalismo em outras partes.” (BOTTOMORE, 1983, p.2)
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
BOTTOMORE,
Tom (Org.). Acumulação primitiva. In: Dicionário do
Pensamento Marxista. Rio de Janeiro, 1983. p. 2-3.
Adaptado de trabalho de Anderson Bem
Fonte: Blog Sertão Potiguar
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