Além da
perspectiva liberal, neoliberal e marxista sobre a pobreza, existem abordagens
diversas sobre a mesma, embora não se inscreva explicitamente nas correntes de
pensamentos citadas anteriormente, se apresentam como análises de relevância no
debate contemporâneo sobre a pobreza.
Inicialmente trataremos da compreensão
da pobreza partindo de análises propostas por duas instituições de grande
relevância política, ideológica, econômica, social e cultural – a Igreja
Católica, com base na Encíclica Rerum Novarum e o Banco Mundial.
A Encíclica Rerum Novarum foi escrita em 1891
em resposta à publicação do Manifesto do Partido Comunista, de Marx e Engels. A
Encíclica publicada pelo Papa Leão XIII, representaria o que Siqueira (2013),
chama de “manifesto do Vaticano” e o que para a autora, representou uma clara
posição da Igreja Católica a favor dos interesses do grande capital.
Segundo a compreensão de Siqueira (2013), a concepção de pobreza a
partir da Encíclica, trata-se de uma pobreza que deve ser aceita pacificamente,
na medida em que não seja uma humilhação, sendo o pobre aquele sujeito que não
deve envergonhar-se de sua condição, mas ter orgulho do pouco que possui
através de seu trabalho. A solução para o problema da pobreza na sociedade,
apontada pela Encíclica é a caridade, como um valor atribuído aos cristãos.
Em síntese, concebe-se a pobreza como “natural”
produto das desigualdades e diferenças individuais, as capacidades e esforços diversos,
o pobre como “classe inferior” “em situação de infortúnio e de miséria
imerecida”, como “deserdados da fortuna” e a riqueza é entendida como
“propriedade particular”, produto do esforço de cada um, constituindo um
“direito natural” que é legitimado e sancionado pela lei dos homens e divinas e
protegida pelo Estado. Assim as formas de enfrentar a pobreza sustentam-se na
caridade e benevolência sinceras, em que o trabalhador e o pobre devem se
resignar e aceitar com paciência a sua condição, evitando a “solução
socialista”, o conflito de classes, mas buscando a conciliação entre elas,
mediante o respeito de seus deveres como operário e como patrões. O fim é a
manutenção da ordem, sendo o desafio e a missão para os ricos serem generosos e
os pobres abnegados e sem inveja do patrimônio alheio”. (SIQUEIRA. 2013, p.116).
Ao Estado atribui-se a função de assegurar a propriedade privada,
legitimada pela igreja como um direito natural, fruto de capacidades e esforços
individuais. O Estado também tem a função de intervir e preservar a ordem
social, numa tentativa de convencimento de uma neutralidade que não existe.
Tratando agora sobre o Banco
Mundial, este concebe a pobreza sob uma ótica multilateral, em um cenário no
qual o avanço neoliberal atribui ao Estado uma intervenção mínima no social e
máxima para o desenvolvimento do capital. Sob essa perspectiva, o Banco Mundial
promove ações políticas de alívio da pobreza, através de mecanismos de ajuda internacional mediante transferências de capitais e tecnologias. Com isso, o
Banco Mundial vem se tornando o principal promotor das políticas de combate à
pobreza, sobretudo nos países periféricos.
O relatório do Banco Mundial de 1990 trata da
pobreza no mundo em desenvolvimento, logo tem um enfoque maior na população
mais pobre entre as pobres, buscando a medição qualitativa e quantitativa da
pobreza. O relatório da década de 90 classifica a pobreza com base na situação
econômica, medida pelo (PNB) Produto Nacional Bruto ou renda per capita. Assim,
os indicadores de renda irão conceituar a pobreza. Ainda nesse mesmo relatório,
a estratégia do Banco Mundial para reduzir a pobreza, baseia-se na
transferência de renda, atividades laborativas e promoção de atividades ligadas
à assistência.
Na década de 2000 a estratégia de
redução da pobreza do BM é modificada, agora suas ações baseiam-se na promoção
de oportunidades, autonomia e segurança dos pobres. Segundo Siqueira (2013), o
relatório do BM de 2000/2001 amplia o seu conceito de pobreza, passando a
considerar outros fatores que determinam a condição de pobreza. “A estratégia
apresentada nesse relatório reconhece que a pobreza é mais do que renda ou
desenvolvimento humano inadequado; é também vulnerabilidade, falta de voz,
poder e representação”. (Siqueira, 2013, p.120). Diante disso, o Banco mundial
passa a conceber a pobreza sob uma perspectiva multidimensional, supostamente
mais abrangente que a visão econômica.
Segundo Siqueira (2013), os documentos
produzidos pelo Banco Mundial representam seus próprios objetivos, que são o de
fomentar e promover as políticas de combate à pobreza em articulação com os
governos mundiais dependentes de sua ajuda. O BM pretende identificar,
quantificar e qualificar os pobres.
Com a proposta de construir um mundo sem pobreza, o BM na verdade a
reforça, segundo Siqueira, incentivando a acumulação da riqueza socialmente
produzida e com ela as contradições inerentes às dívidas públicas, às
“soluções” emergenciais e temporárias das mais desumanas formas de vida,
estruturadas pelos interesses da ideologia neoliberal.
Priscila Morais